segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

À Elizabeth Bishop

E o dia então chorou.
Tanto quanto eu nunca o fiz,
tanto que eu mesmo nunca vi.

Preciso de refúgio, uma sombra
que me afaste das nuvens pesadas.
Eu preciso de um cigarro pra acender a minha alma.

A água então escorreu em cascatas brancas
do zinco até o chão, molhando o sim e o não...
Entre cimento, tijolos e a escuridão.

Então não pude me conter, apesar de tanto querer.
E ela me maltrata, é má, maluca,
vem e vai quando quer, entra e sai quando lhe der.

Eu que gosto tanto da água e sua lama
queria a secura do corpo em chamas.
Creio não ser mais anfíbio. Talvez a seca.

Eu queria o sol nesse momento,
brilhando forte qual diamante no rio.
Só que não passo de um dependente, um girassol.

E de colher em colher a parede e o homem
enchem os olhos de imaginação.
Entre roncos, motores e construção
encho meus rios com lágrima, sofrimento e solidão.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Mais uma de amor.

Acho que não existe amor com orgulho.
Existe sim um baião-de-dois...
E com feijão sem gorgulho*!
Um queijo com gioabada,
Um molho com macarrão...
Dessas coisas que você come que se acaba!
Amor de verdade não olha pra si,
Não é egoísta... Olha pro outro.
Um verdadeiro “EU TE AMO”
Desse jeito bem ai mesmo,
Com todas as letras garrafais
Não apela e nem joga sujo.
Muito embora não haja regras nesse mundo.
Coisas desse tipo, soam como sino desafinado
Quando a oração soa gaguejada, esmaecida.
Soa um eu te amo sem aspas. Diminuto.
O amor é feito sino: quando bate todos ouvem.
E nem mesmo o vento, chuva ou tempestade
Movem as montanhas do concreto e do abstrato como ele.
O amor faz dos pingos da chuva uma martelada
Latente, imponente e de força descomunal...
Que nem mesmo o próprio ciclo das águas,
Em toda nossa atmosfera,
Consegue mudar o rumo que ele segue.
É um ciclo só dele, sem ciclos, vícios ou lógica
Que o torna careta, ilógico e imprevisível.
E o que eu sei sobre o amor?
Nada. Só o tempo, o vento, a chuva ou tempestade
Poderão um dia me mostrar um rumo.
Ou pelo menos um sentido em sua metade.


* pequeno besouro que ataca o grão de feijão.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Náufrago

Quando o sol se põe e a noite vem
É que me dou conta do infinito.
É como andar pelo mundo, ou vagando pelo mar
Esperando o que não virá, indo pra qualquer lugar.
E no meu lugar não há destino,
Pouco importa onde eu vá...
Pois quando não se sabe onde ir,
Qualquer lugar serve, importante é chegar.
Hoje eu saí na rua, ouvi as aves como sempre
Revi os bichos, só em minha mente
Na certeza de que não os verei mais...
Tão pouco aqueles velhos e bons momentos
Que o nosso céu contemplávamos em plena revoada.
A porta se fechou, o dia de ontem se passou
E até meu louro mal passou.
E enfim aquele velho fogo reacendeu,
No meu belo bicho verde-mata
Que no dia de hoje ressuscitou.
Capenga, mal assistido e carente
Caiu de bico, coitado todo estrupiado
Estava sim, com o corpo e a alma doente.
Assim o sol se pôs, o céu se enrubrou. Em mim trovejou.
Só me restam os gritos, as aves e uma lua no ar que chorou.