segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

O munturo



O munturo é um mundo,
uma coisa feita pra reciclar.
Não é só lixo, algo sujo, imundo,
é talvez só o tempo suspenso no ar.

Ouvi e vi o munturo na casa de minha vó
e confesso, não achava sentido algum...
Era literalmente uma montanha de coisas,
totalmente amontoadas, tão desorganizadas
que no final das contas eu nem imaginava
que aquilo tudo em pó se transformava...

Meu avô um dia me disse que alí era o descarte,
mas que sempre alguém buscava sua arte...
Era lá a solução dos problemas do dia-a-dia,
dos afazeres que o criar dependia.

E a vida, meus caros, não é só a vivência.
Ela depende do reinventar... E só pra rimar,
eu que nem gosto de enfeitar, a vida é reciclar.

Reciclar as ideias, o teu lixo, a tua vida.
Disso você depende, todo santo dia.
E nem me venha dizer que é história de biólogo,
desses tal ecólogo que sempre te dizem
o que fazer, o que viver, porque senão...

Na verdade, o lixo ao qual me refiro é o do resto.
Não o resto de alma mal vivida,
do esgoto da estética descabida
da roupa na loja vendida, sem nenhum propósito
sem a boa lógica e com destino certo:
um munturo sem função de reciclar. De aproveitar.

Hoje olho pro meu quintal e ouço as vozes dos que já foram.
Deles, só avô materno ainda me resta. E ainda bem que sua voz ecoa
tão forte que nem preciso estar desvairando pra viver a verdade.
Nem preciso olhar pro céu e ver dragões, coelhos
tudo que minha mente vê e otras cositas más...

E enfim, o munturo se fez em mim.
Sou a parte do todo, o pó das estrelas
e o brilho pretérido delas. Mas antes disso,
bem antes do fim, quero ser a parte da água,
parte do maior munturo que chamam de mar.

Continuo a ser o fio, o pano que chamam rio.
Um munturo a navegar. E eu sou um mundo.

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